Humanidades

Estudo avalia impacto de políticas públicas no combate a  “economia do crime”
Ausaªncia de resultados efetivos na redua§a£o de homicidios após implementaa§a£o reforça necessidade de acompanhar políticas de segurança com base em estudos cienta­ficos
Por Júlio Bernardes - 28/02/2020


Efeitos de políticas públicas na taxa de homicidios foram analisados a partir de
modelos baseados no conceito de “economia do crime”, corrente de estudos
econa´micos sobre as causas da criminalidade; segundo esta linha de pesquisa,
políticas públicas podem apresentar efeitos negativos sobre a oferta criminal,
dissuadindo os ofensores de ingressarem no mercado ilegal 
Foto: Fernando Fraza£o/Agência Brasil-Fotos Paºblicas

Os impactos de duas políticas públicas sobre a taxa de homicidios no Brasil são avaliados em pesquisa da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba. O estudo revela que o Programa Nacional de Segurança Paºblica com Cidadania (Pronasci), do governo federal, não foi efetivo em reduzir a taxa de homicidios nos munica­pios que receberam recursos do programa. E no Estado de Sa£o Paulo, a saa­da de alguns munica­pios do Programa Escola da Fama­lia (PEF), do governo estadual, não influenciou a taxa de homicidios. Os dois programas foram analisados a partir de modelos baseados no conceito de “economia do crime”, uma corrente de estudos econa´micos sobre as causas da criminalidade.

“O precursor dessa linha de pesquisa éo professor Gary Becker, da Universidade de Chicago (Estados Unidos), que em 1968 publicou o artigo ‘Crime and Punishment: an Economic Approach’”, conta a economista Talita Egevardt de Castro, autora do trabalho. “Becker desenvolveu um modelo econa´mico do crime que considera a atividade ilegal como uma atividade econa´mica, assim como as atividades legais. Nesta atividade, observa a pesquisadora, o “empresa¡rio” éo ofensor, que decide racionalmente ofertar o crime, ponderando os custos e benefa­cios a serem auferidos com a atividade. “As políticas públicas podem apresentar efeitos negativos sobre a oferta criminal, dissuadindo os ofensores de ingressarem no mercado ilegal”, ressalta.

O Pronasci foi lana§ado pelo governo federal em 20 de agosto de 2007, coordenado pelo Ministanãrio da Justia§a. “Com sua diversidade de ações, ele poderia reduzir a criminalidade atravanãs de um aumento na probabilidade de apreensão e condenação, reduzindo o retorno esperado com a atividade ilegal e consequentemente, a oferta de crimes”, aponta a economista. “As ações de prevenção e enfrentamento da violência poderiam aumentar oníveleducacional, a renda, a coesão social e propiciar melhores oportunidades de trabalho, entre outros fatores, que também poderiam reduzir o retorno esperado com a atividade ilegal, reduzindo a atividade criminal.”

Resultados

Segundo Talita de Castro, a partir da comparação entre os dados dos anos de 2000 e 2010, a pesquisa verificou que o Pronasci não foi efetivo em reduzir a taxa de homicidios dos munica­pios que receberam recursos para realizar as atividades do programa. A economista recomenda a realização de novas investigações sobre os motivos que levaram ao fracasso do Pronasci emnívelnacional, para que políticas públicas com desenho semelhante ou idaªntico não cometam os mesmos erros.

O Programa Escola da Fama­lia (PEF) foi criado em 23 de agosto de 2003 pela Secretaria de Estado da Educação de Sa£o Paulo e instituições parceiras, e institua­do pelo governo do Estado em julho de 2004. “Embora não desenvolva ações propriamente de segurança pública, o programa visa a reduzir a vulnerabilidade de criana§as e adolescentes com ações socioeducativas, oferecendo atividades aos jovens, familiares e comunidade”, relata Talita. As atividades do programa são realizadas em escolas públicas, nos finais de semana. “Assim, o programa, atravanãs de uma melhoria na educação, nas relações interpessoais, redução da desorganização social e do tempo ocioso dos participantes, poderia aumentar o custo de oportunidade do crime, reduzir o retorno esperado da atividade ilegal e, por conseguinte, a criminalidade.”

Em 2007, houve uma redução do PEF e alguns munica­pios do Estado deixaram o programa. “Os resultados do estudo não sustentam que houve um aumento das taxas de homicidios nestes munica­pios”, afirma a economista. “Em relação ao PEF, outros estudos podem ser realizados considerando umnívelterritorial diferente, ou ainda, outros tipos de crimes.”

A especialista recomenda a implementação de políticas de segurança pública fundamentadas em estudos cienta­ficos, cujos resultados sejam monitorados, durante e após a finalização dos programas, para uma alocação mais eficiente dos recursos paºblicos. O trabalho foi orientado pela professora Ana Laºcia Kassouf, da Esalq, e co-orientado pelo professor Marcelo Justus dos Santos, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A pesquisa édescrita na tese de doutorado Pola­ticas de segurança pública no Brasil sob o olhar da Economia do Crime: os casos do Pronasci e Programa Escola da Fama­lia, defendida na Esalq em 2019.

 

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